quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Cláudia Leitão - A dimensão econômica da cultura precisa avançar


A ex-secretária de Cultura do Estado do Ceará, a  pesquisadora e gestora cultural, Claudia Leitão foi uma das principais formuladoras e incentivadoras da Secretaria da Economia Criativa do Ministério da Cultura. A professora acredita que é avalia que o Brasil avançou na dimensão simbólica e cidadã nos últimos anos, mas ressalta que é preciso avançar no campo econômico da cultura.  

Alexandre Lucas - Quem é Claudia Leitão?

Claudia Leitão - Uma professora e pesquisadora brasileira, uma gestora cultural apaixonada pela reflexão sobre as políticas públicas de cultura, especialmente, sobre as conexões entre a cultura e o desenvolvimento. 

Alexandre Lucas -  Como se deu sua inserção no campo das Políticas Públicas para Cultura?

Claudia Leitão - Eu me graduei em Direito e, em seguida, em Música. A cultura e o conhecimento científico sempre atravessaram a minha vida. De início, através dos estudos da flauta, no Conservatório Alberto Nepomuceno, em Fortaleza. Depois, graças ao meu  doutorado em Sociologia na Sorbonne, em Paris. A descoberta da cultura, na perspectiva das políticas públicas, acontece dentro da minha trajetória acadêmica na Universidade Estadual no Ceará, quando coordenei a primeira especialização em Gestão Cultural. Mas, certamente, meu grande "mergulho" no universo das políticas públicas da cultura se deu quando fui secretária de cultura do Ceará, entre 2003 e 2006. Esses quatro anos mudaram meu olhar sobre meu Estado mas, também, sobre minha vida acadêmica. E esse "divisor  de águas" se dá quando, no início da minha gestão, inicio com minha equipe o  planejamento da Secult. O Plano, produto desse processo, tornou-se um documento fundador de nossa gestão, uma declaração política da nossa decisão de trazermos para o Estado a tarefa de liderança na formulação, implantação, monitoramento e avaliação de políticas públicas (e não governamentais,!) de cultura. O mais interessante foi a coincidência de termos, naquele momento, chegando ao MinC, o ministro Gilberto Gil. Esse "encontro" foi muito inspirador e resultou em muita cumplicidade entre o Ceará e Brasília durante quatro anos.

Alexandre Lucas – Fale da sua trajetória:

Claudia Leitão -  Minha graduação em Direito me levou a fazer mestrado em Sociologia Juríica na USP. Minha licenciatura em Educação Artística me instigou a fazer  doutorado em Sociologia na Sorbonne. Penso que essas formações que parecem díspares, são absolutamente necessárias e afins quando falamos em políticas públicas e gestão cultural.

Alexandre Lucas – Um dos focos da sua área de pesquisa é o desenvolvimento sustentável.  Qual a relação entre cultura e desenvolvimento?

Claudia Leitão - As relações entre cultura e desenvolvimento são antigas, mas a sua compreensão vem se transformando, especialmente, ao longo do século 20. De início, a cultura foi considerada uma variável determinista do desenvolvimento e, por isso, tornou-se praticamente um "fatalismo" a favor ou contra o chamado "desenvolvimento" de povos e civilizações. Essa visão foi responsável por inúmeras intervenções ou projetos equivocados de desenvolvimento, quase sempre "exógenos" e, por isso, distantes dos desejos das populações para quem foram destinados. Nas últimas décadas do século 20 e início do século 21, inicia-se uma etapa mais alvissareira nas relações entre cultura e desenvolvimento. Ela vai dar lugar a uma visão "endógena" do desenvolvimento, ou seja, a um "desenvolvimento com envolvimento" das comunidades e populações. Nesse momento, a cultura deixa de ser uma "condenação" mas passa a ser um a priori para o empoderamento e o protagonismo dos indivíduos. E mais. A cultura passa a ser considerada pela Convenção da Diversdade Cultural, produzida pela Unesco, como o quarto pilar do desenvolvimento, ou seja, a cultura passa a qualificar os modelos de desenvolvimento no novo século.

Alexandre Lucas – Como você avalia a políticas públicas para cultura no Ceará?

Claudia Leitão - Um dos problemas relativos às políticas públicas no Ceará, mas também em todo o pais, sejam essas políticas culturais ou não, é o relativo à continuidade ou à perenidade das mesmas. Políticas de Governo no Brasil ainda são compreendidas e tomadas como políticas de Estado. O resultado é que muitas políticas, programas e ações sofrem com sua descontinuidade. No plano federal, estadual e municipal essa problemática acontece e é danosa para o Brasil.
 
Alexandre Lucas - O que é a Economia Criativa?

Claudia Leitão - O conceito de economia criativa está em construção, especialmente no Brasil, um país que poderá liderar, na próxima década, a construção de um modelo de desenvolvimento local e regional para o mundo, a partir da formulação de políticas públicas para a criação, produção, circulação, difusão, consumo e fruição de bens e serviços culturais e criativos. A dinâmica econômica dos bens intangíveis não é a mesma da indústria tradicional. E, por isso, carece de estudos e pesquisas, para que sejam produzidos diagnósticos dos setores culturais, em suas especificidades, além da necessidade de se mapear as vocações regionais. Mas, não tenho dúvida que a diversidade cultural brasileira poderá se tornar um ativo econômico importante para a inclusão produtiva em nosso país.

Alexandre Lucas -   Uma das críticas a Economia Criativa é sobre risco de mercantilização da produção artística. Como Você ver essa questão?

Claudia Leitão - A ausência de políticas públicas que intervenham e estabeleçam regras para os mercados, acaba permitindo  que essas mercantilização se dê da forma radical e excludente. Por isso, é tarefa do Estado enfrentar as assimetrias produzidas pelo sistema capitalista, estabelecendo as " regras do jogo" para a economia,especialmente, para a economia da cultura, garantindo, enfim, sua sustentabilidade.

Alexandre Lucas -  A partir da gestão do primeiro Governo Lula o país vive uma nova conjuntura no campo das Políticas Públicas para Cultura, o que gerou um novo protagonismo dos movimentos culturais da cultura. Qual a sua percepção em relação a essa questão?

Claudia Leitão - Penso que a partir do Governo Lula, o Ministério da Cultura alçou novos patamares na formulação de políticas públicas para a cultura. O programa "Cultura Viva" é o exemplo de uma política cultural que privilegia e reconhece a ação dos pequenos, ou seja, daqueles que produzem cultura nos territórios mais longínquos do país. Mas, se o MinC avançou nas dimensões simbólica e cidadã da cultura, considero que a dimensão econômica necessita ainda avançar. Os desafios da Secretaria da Economia Criativa são grandiosos: produzir dados confiáveis sobre o campo cultural e criativo brasileiros, formar profissionais qualificados, oferecer fomento aos empreendedores criativos e definir marcos legais que permitam o florescimento da economia criativa brasileira.

Alexandre Lucas -  Um dos grandes  desafios para as políticas públicas para a cultura  é a criação de um marco legal que garanta a sustentabilidade financeira. Como é o caso da PEC 150 que prevê a garantia de 2% do orçamento da União, 1,5% dos Estados e 1% dos Municípios para a Cultura.  O que representa isso para o desenvolvimento do país?

Claudia Leitão - Aos poucos, o campo cultural vai conquistando garantias jurídicas. Os "direitos culturais", direitos de terceira geração, hoje são considerados direitos humanos fundamentais. A legislação recém aprovada do Sistema Nacional de Cultura é estratégica para o avanço da políticas públicas de cultura no pais. Mas, não acredito que a PEC 150 seja aprovada a curto prazo. De qualquer forma, outros marcos legais precisam ser criados, e talvez sejam mais viáveis a curto ou médio prazos. São marcos trabalhistas, previdenciários, tributários, civis, administrativos, entre outros. Precisamos de uma Frente Parlamentar da Economia Criativa Brasileira, antes que os chineses inviabilizem as dinâmicas econômicas dos nossps bens e serviços culturais.


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Toni C – O mano da Nação Hip-Hop


Artista multimídia, autor do romance "O Hip-Hop Está Morto!" e do documentário É Tudo Nosso!, organizador do Hip-Hop a Lápis. Membro da Nação Hip-Hop Brasil e editor audiovisual da TV Vermelho, Toni C é um dos expoentes que vem narrando a história de diversidade e complexidade do Movimento Hip-Hop Brasil.    


Alexandre Lucas - Quem é Toni C?

Toni C - É um cara, como qualquer outra pessoa, que é e faz muitas coisas. Pra facilitar pode ser classificado como multimédia, artista e ativista. Autor de alguns livros sobre Hip-Hop, o mais atual é a biografia de Sabotage, ou seja, sou mais um louco sonhador.


Alexandre Lucas - Como ocorreram os seus primeiros contatos com arte?

Toni C - Desde o nascimento, seguramente. Porém dessa época não tenho muitas lembranças.

Alexandre Lucas - Como surgiu o Hip-Hop na sua vida? 

Toni C - Na infância me lembro de ver o break nos programas Raul Gil,  Barros de Alencar também e na São Bento, bem pequeno passeando com meus pais via aqueles malucos...  Ouvia os balanços, que era como a gente chamava o Rap naquele tempo, na escola, com meus primos mais velhos e do som da escola de samba do bairro, a Mocidade Alegre.

Alexandre Lucas -  Fale da sua trajetória: 

Toni C - Estou ainda trilhando essa trajetória, feito à custa de muita sola de tênis, pedaladas de bike, passando por quebradas, escolas públicas, quadras de basquete, movimento estudantil e sem dúvidas o Hip-Hop.

Alexandre Lucas - Como você avalia o Movimento Hip-hop na atualidade? 

Toni C - Rapaz, é complexo essa questão. Tanto que escrevi um livro a respeito, chamado "O Hip-Hop está Morto!" está cultura está passando por uma transição, uma transformação grande com componentes que vão desde o mercado fonográfico até questões geracionais, passando pela discussão de gênero e o regionalismo. Enfim, quer saber mais, leia o livro.

Alexandre Lucas - Você foi um dos responsáveis pela criação da Nação Hip Hop Brasil. O que é mesmo essa Nação?

Toni C - Fui não, sou responsável, tenho orgulho em pertencer a esta organização desde sua fundação. A Nação Hip-Hop é uma rede formada por gente do Hip-Hop de todo o país que percebe dificuldades parecidas em produzir e difundir nossa cultura, ou seja, em Fortaleza ou aqui em São Paulo, e uma vez identificado problemas comuns, podemos encontrar soluções semelhantes. Hoje nossa organização é considerada a maior entidade de Hip-Hop da América Latina.

Alexandre Lucas -  A Nação Hip-Hop vive um processo de reconstrução? 

Toni C - Reconstrução permanente, de si própria, do movimento Hip-Hop e da sociedade. Quer somar nesta construção? Acesse o site da entidade (www.nacaohiphopbrasil.com.br) e venha fazer parte você também.

Alexandre Lucas - Você vem narrando nos últimos anos parte da história do Hip-Hop. Qual a importância desse trabalho? 

Toni C - A história oficial do Brasil não tem a participação dos negros, não tem participação dos verdadeiros brasileiros, que os "descobridores" chamaram de índios, afinal estavam descobrindo a Índia. Pois bem, parafraseando meu parceiro  Hot Black na música É Tudo Nosso:

"Onde está escrito que estou sujeito
a ser nota de rodapé
 
dos livros de história
sem glória"
Sairmos da nota de rodapé para as capas do livro, hoje somos os escritores, os personagens, as fontes, os pesquisadores... A história é sempre contada pelo ponto de vista dos vencedores. Taí duas coisas que precisamos fazer: vencer e escrever a nossa própria história.

Alexandre Lucas - Como você caracteriza o seu trabalho? 
Toni C - Luta. Luta política, luta ideológica e a batalha de ideias é a mãe de toas as batalhas.

Alexandre Lucas - Quais os seus próximos trabalhos?
Hoje meu trabalho é mostrar a todos meu novo filho recém nascido: A biografia de Sabotage: Um Bom Lugar. (www.literaRUA.com.br)





Saiba mais sobre o trabalho de Toni C:
Toni C. é autor do romance "O Hip-Hop Está Morto!" – A História do Hip-Hop no Brasil, organizador dos livros #PoucasPalavras de Renan_Inquérito, Um Sonho de Periferia, Hip-Hop a Lápis e Literatura do Oprimido e colaborador da revista Rap Nacional.

Social
Secretário de cultura da Nação Hip-Hop Brasil e da ORPAS - Obras Recreativas Profissionais, Artísticas e Sociais.

Audiovisual
Diretor do documentário É Tudo Nosso! O Hip-Hop Fazendo História. Editor da TV Vermelho e pesquisador do programa Estação Periferia - TV Brasil.

Prêmios
Ganhador do prêmio Cooperifa, recebeu Menção Honrosa pela Câmara de Marília. É reconhecido como uma das pessoas mais influentes da cultura brasileira, através dos prêmios Tuxáua e Escola Viva, pelo Ministério da Cultura. Foi congratulado pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul com a Medalha Comemorativa da 53ª Legislatura do Estado.

Bibliografia Completa:

Antologias
Hip-Hop a Lápis - O livro (2005)
Hip-Hop a Lápis 2 - Literatura do Oprimido (2010)
Um Sonho de Periferia (2011)

Romance
"O Hip-Hop Está Morto!" - A História do Hip-Hop no Brasil (2012)

Biografia
Um Bom Lugar - Biografia Oficial de Mauro Mateus dos Santos - Sabotage (2013)

Prefácio e comentários
Colecionador de Pedras - Sérgio Vaz (2006)
Trajetória de Um Guerreiro - DJ Raffa (2008)
Rap Dez - O Primeiro rapper dos Quadrinhos -Marcio Baraldi (2011)
Do Conto à Poesia - Alessandro Buzo (2011)
#PoucasPalavras - @RENAN_INQUERITO (2011)

Veja essa e outras entrevistas no Blog das Entrevistas: www.blogdasentrevistas.blogspot.com