quarta-feira, 30 de maio de 2012

Izaíra Silvino - Democratizar a educação para democratizar a música

Professora, escritora, poeta, compositora, arranjadora, regente, mulher e aprendiz, Izaíra Silvino tem desempenhado um papel importante na música no Estado do Ceará. Tendo iniciado seus primeiros contatos com o universo musical na infância, Izaíra é contundente ao afirmar que para democratizar a música “é preciso democratizar a educação do povo brasileiro, em todos os níveis e espaços. Feito isto, a democracia é possível, em qualquer ângulo!”.

Alexandre Lucas – Quem é Izaíra Silvino? 

Izaíra Silvino - No momento, estou sendo empresária, trabalhadora de uma das cadeias produtivas da Economia Criativa (editoração e produção). Estou uma das proprietárias da DIZ Editor(A)ção). Estou professora - eventualmente - e estou palestrando sobre as relações da música com a educação. Desafio-me a continuar sendo compositora, arranjadora, escritora e poeta . 

Alexandre Lucas – Com se deu seu contato com a música? 

Izaíra Silvino - Ainda criançinha, minha Mamãe e meu Papai descobriram-me amante da Música (eu cantava desde o berço). Aos cinco anos, já estava frequentando aulas da Professora Amélio Cavalcante (uma pedagoga musical de Iguatu-CE), com quem aprendi a tocar bandolim (1950). Desde então, estou em mergulho musical perene, onde, ainda, aprendo a nadar! Alexandre Lucas – Fale da sua trajetória: Izaíra Silvino - Fui violinista da Orquestra Sinfônica Henrique Jorge (anos sessenta), fui Professora de Educação Artística (escolas municipais, Fortaleza e Crato, e estaduais - anos setenta), fui professora da FACED- UFC e Regente dos Corais da UFC e FACED-UFC, do Coral da Biodança, do Coral da EMBRATEL, do Coral Santa Cecícia da SOLIBEL - anos oitenta e noventa e Grupo Vocal Moenda de Canto (anos noventa). Assessora da FUNARTE, nos Painéis de Coros, desde 2002. Fiz-me Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFC (1969), Licenciada em Música pela UECE (1973), Especialista em Música do Século XX pela UECE (1995), Mestra em Educação pela UFC (1996). 

Alexandre Lucas – Você acredita que a Academia elitiza a música? 

Izaira Silvino - De minha experiência, posso responder NÃO a esta questão. Mas se levarmos em consideração o número de habitantes de um lugar e relacionarmos este número com o número percentual de pessoas que alcançam e vivem e frequentam as atividades fins da academia (conhecimentos vivenciados e construídos a partir do ensino, da pesquisa e da extensão universitária), pode-se falar em ELITE. Mas não em 'elitismo'. Na academia trabalha-se conhecimentos já sedimentados, como, também, trabalha-se com conhecimentos de vanguarda. Vamos dizer que isto seja como a 'nata' da realidade. Mas é bom lembrar que não existe 'nata' sem leite. Então, não existe academia sem uma realidade posta. Isto, a meu ver, desmonta o argumento de elitismo. 

Alexandre Lucas – Como ver essa denominação de música popular e erudita? 

Izaira Silvino - Para mim, esta divisão não existe. Ela foi estabelecida por uma lógica de exclusão. Quem divide, termina por diminuir, não é isto? Música, a gente compartilha, não divide. Milhões de pessoas podem ouvir, ao mesmo tempo, a mesma música. Sem divisões. Claro que, de uma composição para outra composição, há diferenças: estéticas, estilísticas, gramaticais, teóricas, históricas, autorais... mas divisões? Nunca! Tudo é Música. Tudo espaços sonoros-rítmicos, organizados a partir do poder expressivo do compositor. Qualquer idéia de divisão é falsa, elitista, racionalista, manipuladora. 

Alexandre Lucas – É preciso democratizar a produção musical brasileira? 

Izaíra Silvino - É preciso democratizar a educação do povo brasileiro, em todos os níveis e espaços. Feito isto, a democracia é possível, em qualquer ângulo! Alexandre Lucas – A obrigatoriedade do Ensino de Musicas nas Escolas de Ensino Básico é uma forma de democratizar a diversidade musical? Izaíra Silvino - É uma forma de ampliar a formação do povo brasileiro, portanto, de ampliar os espaços de democratização - de saberes, poderes, vozes, do diverso, do uno, da grandeza, da fartura (no plano individual, como no plano coletivo)! 

Alexandre Lucas – Qual a contribuição social do seu trabalho? 

Izaíra Silvino - Ih!!!!!!!!! Quem sou eu para ter a veleidade de medir se há esta contribuição!? Quando a gente nasce com um corpo e ocupa um espaço neste planeta, a gente já é contribuinte, de vida e da própria vida! Se a gente contribui positiva ou negativamente? Isto, quem sabe é quem recebe e compartilha. Para nós, atores da vida, autores de nossa sina, só resta aprender a AMAR! Alexandre Lucas – A música denominada de Música Popular Brasileira – MPB desempenhou um importante papel no enfretamento a Ditadura Militar no Brasil. Você acredita que os músicos perderam essa viés político na contemporaneidade? Izaíra Silvino - Não sei se perderam... Mas custa-se, hoje, 'achar' a cor deste viés! Da mesma forma como, também, é muito difícil identificar as 'ditaduras' que nos assolam neste momento vivido. 

Alexandre Lucas – Quais os seus próximos trabalhos? 

Izaíra Silvino - Aprender, aprender, aprender. Aceitar os desafios da vida! Dizer sim ao amor e ao aprendizado do amor! Viver a corda bamba da adolescência da minha velhice!

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Ana Rosa Dias Borges - A perseguidora de memórias


Vasculhar,compreender e socializar as histórias de narrativas orais populares do Cariri cearense é um dos prazeres da historiadora e pesquisadora cultural Ana Rosa Dias Borges. A Professora reconhece que  “ao preservarmos nosso patrimônio cultural imaterial estamos contribuindo para o aprendizado da cidadania, tão necessário em nossos dias”. Autora do livro “Narrativas Orais no Barro Vermelho” que é um exemplo da importância do resgate da história a partir das relações de pertencimento e identidade. 


Alexandre Lucas - Quem é Ana Rosa Dias Borges?   

Ana Rosa Dias Borges - Cratense, contadora de historias para crianças, avó, historiadora, professora, pesquisadora cultural, amante da arte literária, uma misturança só.

Alexandre Lucas – Você já vem desenvolvendo há muitos anos um trabalho de incentivo a leitura. Fale sobre esse trabalho.

Ana Rosa Dias Borges  - Quando trabalhava com editoras comecei a contar histórias para crianças na Rede de Ensino do Recife. Encantei-me com o que vi e senti ao contar histórias. A necessidade de aprofundamento no tema levou-me a cursar uma especialização em Literatura Infanto- Juvenil, que versou sobre os contos orais, das comunidades narrativas orais da Chapada do Araripe. E assim, de posse desse conhecimento teórico , que empiricamente já me seduzia, intensifiquei as ações de incentivo a leitura, publicando artigos em revistas especializadas em Literatura Infanto- Juvenil e Educação, contando as histórias compiladas da Serra do Araripe em bibliotecas e escolas em geral, oferecendo oficinas de formação para educadores em parceria com secretarias municipais de educação e na rede privada de ensino, prestando assessorias pedagógicas, ministrando palestras, sempre disseminando o encantamento que os contos fantásticos provocam naqueles que estão em processos construtivos literários.

Alexandre Lucas – Você é uma pessoa que busca a partir das suas pesquisas sobre narrativas orais criar relações de identidade e pertencimento com o povo.  Qual o significado disso?

Ana Rosa Dias Borges - O sentimento de pertença e identitário inerente ao ser humano são compartilhados por um mesmo grupo social, ou seja, o mesmo imaginário social. De forma que as idéias, os costumes, as tradições e os mitos fundam uma realidade social e deveriam estar presentes nos processos construtivos educacionais escolares, pois ao preservarmos nosso patrimônio cultural imaterial estamos contribuindo para o aprendizado da cidadania, tão necessário em nossos dias. E as narrativas populares orais, tem esse poder. Elas carregam consigo toda essa gama de simbolismo, valorizam no ser sua identidade cultural o que desencadeia os questionamentos necessários relacionados àquilo que somos e o porque do que somos.

Alexandre Lucas – Você lançou o livro “Narrativas Orais no Barro Vermelho”. Como foi esse trabalho? 

Ana Rosa Dias Borges - A artesania do livro Narrativas Orais no Barro Vermelho teve início quando o projeto que enviei ao MINC foi aprovado. Um programa denominado, Micro Projetos Mais Cultura, que contempla iniciativas culturais de cunho popular e abrangência comunitária.

Assim como eu já tinha desenvolvido a pesquisa dos contos populares na Chapada do Araripe e encontrava-me completamente envolvida com o tema narrativas orais populares, decidi dar continuidade ao trabalho, agora na cidade do Crato. A escolha do Alto da Penha, antes Barro Vermelho, se deu em função de ser essa uma comunidade emblemática, estigmatizada, uma das primeiras áreas periféricas da cidade, com um imaginário coletivo repleto de mitos, lendas, assombrações e também a formação de um tecido social interligada a formação histórica do Crato. Ademais, na minha infância, morei muito próximo e desenvolvi laços afetivos e identitários com o bairro.  

Alexandre Lucas – Você desenvolveu um trabalho de resgate da história dos  Dramas na cidade do Crato. Conte essa história.  

Ana Rosa Dias Borges - Quando criança, no Sitio Guaribas, localizado no Sopé da Capada do Araripe, tive a alegria e o imenso prazer de viver toda a magia dos Dramas. As moças do lugar, antes das festas natalinas, apresentavam os Dramas, que eram duetos cantados, em um palco improvisado, ora em cima de um caminhão, ora em cima de uma grande mesa, ora em uma calçada alta

Alexandre Lucas – Você acredita que a história da nossa ancestralidade vem sendo perdida?

Ana Rosa Dias Borges - Embora ocorram movimentos educativos e culturais com vistas a deter esse processo, percebe-se que são iniciativas tímidas e de abrangência diminuta. Muito da nossa ancestralidade histórica se perdeu. Entretanto, os aprofundamentos e as discussões acadêmicas, as ações dos organismos não governamentais nesse sentido e a implantação dessa temática no Sistema de Ensino Regular, vislumbram a contra mão dessa constatação.

Alexandre Lucas – Quais os seus próximos trabalhos?  

Ana Rosa Dias Borges - De certo estarei sempre envolvida em pesquisas que versam sobre as temáticas populares em memória. No momento estou amadurecendo a idéia de outra publicação. Faltam apenas os recursos. Mas estamos na busca e a concretização dessa ideia muito me fascina.





quarta-feira, 16 de maio de 2012

Josenir Lacerda - A fala mansa do encanto


A cordelista carrega uma exuberância de versos fraternos na forma de lida com a literatura.  Josenir Lacerda é uma das inúmeras mulheres do Cariri que escreve cordel e que transita cotidianamente no universo da arte. Integrante da Academia dos Cordelistas do Crato e da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Josenir montou na sua própria casa uma budega para divulgar o artesanato e a literatura “popular”, na qual recebe artistas e pesquisadores de diversos estados brasileiros para beber da sua deliciosa conversa mansinha.       






Alexandre Lucas - Quem é Josenir Lacerda?

Josenir Lacerda –
Sou poeta, cordelista
Sou dedicada artesão
Natural aqui do Crato
E dele ardorosa fã
Retalhos de “ser feliz”
Emendo a cada manhã
Garanto que ainda sou
A mesma eterna criança
Que brinca de embalar sonhos
De fabricar esperança
Na mente imaginativa
A fantasia inda dança
Elói Teles, Patativa
Também o Cego Aderaldo
Os meus pais e meus avós
Professor Zé Esmeraldo
São exemplos de vida
Meu incentivo e respaldo.
Pela arte popular
Sinto um amor verdadeiro
Vejo em nossa tradição
Rico e cultural celeiro
Que transforma o Cariri
Em vasto e fértil canteiro.

Alexandre Lucas - Quando teve início o seu despertar pela Leitura?


Josenir Lacerda – Na infância ainda, começou meu interesse pela leitura.
 
Alexandre Lucas – Qual a influência do seu trabalho?


Josenir Lacerda – Tenho admiração por vários poetas e escritores, o que me estimulou a escrever, porém nunca me detive para tentar descobrir algum sinal que caracterizasse a influência de algum especificamente.
 
Alexandre Lucas – Fale da sua trajetória?


Josenir Lacerda – Escrevo por necessidade de comunicação, bloqueada pela timidez, desde a adolescência. Tenho alguns cordéis publicados antes do meu ingresso na Academia dos Cordelistas do Crato em 1991 e hoje e conto com uma significativa produção divulgada em alguns pontos do Brasil. Em 2010 ingressei na Academia Brasileira de Literatura de Cordel no Rio de Janeiro.

Alexandre Lucas – Qual foi o seu primeiro cordel?


Josenir Lacerda – Foi “O Manequim”, que continuava inédito, engavetado esperando seu momento. O primeiro editado, foi “A “cabôca” que enganou o santo” em parceria com Iris Tavares. E ao ingressar na ACC foi “Severino e Luzia ou As Proezas do Destino”.

 
 Alexandre Lucas – A região do Cariri se destaca pela quantidade de
 cordelistas. Isso influenciou a sua carreira poética?


Josenir Lacerda – A efervescência cultural do Cariri como um todo, estimula, contagia e influencia.
 
Alexandre Lucas – Você hoje faz parte da Academia Brasileira de
 Literatura de Cordel. O que isso representa para você?


Josenir Lacerda – Significa não só uma conquista pessoal como cordelista, mas a chance de representar a mulher caririense na conceituada instituição nacional do cordel.
 
Alexandre Lucas - Como você caracteriza a sua poética?


Josenir Lacerda – Prefiro não buscar uma característica específica, pois de certa forma isso gera um rótulo e tira um pouco da liberdade de explorar os temas. Costumo dizer que a inspiração é igual a menino “birrento” que chega puxando a saia da mãe querendo algo imediatamente nos momentos inoportunos e inusitados. Geralmente procuro atender ao tema sugerido pela “musa” sem me preocupar em manter uma linha ou característica. Talvez minha poética tenha essa característica: “diversidade de temas“.
 
Alexandre Lucas – A sua residência se tornou ponto de referência para
 a pesquisa sobre cultura popular por conta do espaço que você criou
 “Cordel e Arte”. Isso contribui para a sua produção poética?


Josenir Lacerda – Contribui sim, pois cada contato oferece um pouco de conhecimento, aprendizado, informação e isso alimenta a criatividade e estimula a produção.
 
Alexandre Lucas - O que é a poesia para você?


Josenir Lacerda – A poesia pra mim
É uma amiga sincera
Que assume meus queixumes
Faz de inverno, primavera
Compreende os meus medos

Guarda fiel meus segredos
Meu sonho, minha quimera.